sexta-feira, 11 de junho de 2010

Poesia a um poeta.

"ANJO DA VELHA GUARDA

Vivizinha, minha neta,
Bochechinha de carmim
És uma flor bonitinha
Que nasceu no meu jardim.

És a bela borboleta
Que esvoaça no meu céu
Vais crescer moça tão linda
De se tirar o chapéu...

O Vovô não sabe ainda
Quantos anos vai viver
A vida da gente finda,
Só não se sabe por quê

Quando partir desse mundo,
Uma coisa eu decidi:
Não podendo estar contigo,
Ficarei de olho em ti..."


Falcão, Paulo Waldemar. O cristalino espírito da vida. Rio de Janeiro: Editora Elevação, 1999

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ALMA DE PAPEL
Na alma deste papel molhado,
Reside a saudade de ti,
Vovô querido.

Na alma deste papel amassado,
Reside o orgulho de ser tua neta,
Vovô amigo.

Na alma deste papel guardado,
Reside a lembrança, querido Vovô amigo
Do cristalino espírito de tua vida.

Paty do Alferes, RJ - 05 de junho de 2010

Ser ou não ser? Eis a questão.

O que foi,
foi.
O que não foi,
não foi.
O que não é,
talvez venha a ser.

O que foi,
não deixará de ter sido.
O que não foi,
não virá a ser.
O que não é,
continua não sendo
até que seja.

Sonho espatifado...

Uma poça d'água.
Elas faziam questão de permanecer ali, juntas, no chão de madeira, formando uma poça d'água. Certamente estavam ali para me lembrar que haviam sido derramadas, que isso teve motivo e que eu não fui forte para lidar com (mais) aquele problema. Saí dali decidida a não lembrar novamente da dor que estava sentindo. Sentei-me no sofá e, enquanto procurava pelo controle remoto, caí em mais uma armadilha. Tudo estava armado, não era possível.

Um porta-retrato.
Cinza, com um coração vermelho na ponta superior direita e outro igual, do lado oposto. Vazio, deixando claro que estava ali só para se mostrar desocupado, certamente para me lembrar da foto que antes ali estava. Eu quase conseguia ouvir risadas perversas das lágrimas que voltaram a descer pelo meu rosto, como se dissessem "a poça ficou lá, mas nós viemos com você". É lógico que ao lado do porta-retrato havia uma foto. De cabeça para baixo. Rasgada ao meio. Irritada, empurrei aquele objeto opaco e sem vida, certa de que isso faria com que ele fosse apagado de minha memória. Pude ouvir o vidro se quebrando e preferi não olhar para os restos mortais espalhados pelo chão de minha sala. Desviando o olhar, fui à cozinha beber um copo d'água. A pia estava cheia de louça, evidenciando a bagunça similar a do resto da casa. Nenhum copo limpo, optei por uma caneca. No armário, a única caneca que estava ali era aquela. Só uma. Me encarando. Esperando me fazer sentir fracassada qualquer fosse minha atitude. "USO EXCLUSIVO DA PESSOA MAIS AMADA DO MUNDO". Eu não poderia usá-la. Não era a pessoa mais amada do mundo. Não era sequer amada, que dirá a mais amada do mundo.

Um grito.
Foi o que eu consegui fazer; soltar um grito. Com toda a minha força, com todo o meu ódio, com toda a minha tristeza e, acima de tudo, com todo o meu amor. Um grito que doeu a garganta, e minhas cordas vocais reclamaram. Num relance, arranquei a caneca de onde estava e a taquei no chão com toda a minha vontade. Aquilo foi satisfatório. Estranhamente satisfatório. Procurando mais coisas para quebrar, olhei para a pia ao meu lado e decidi jogar tudo. Jogava cada objeto sem segurar o grito. Pude ouvir o interfone tocar e arremessei um prato que pegou em cheio. O fone ficou pendurado e continuei minha sessão de terapia alternativa. Estava começando a achar divertido, quando ouvi batidas à porta. Não. Não podiam me ver naquele estado; perdedora, chorando, irritada e com a perna sangrando devido a alguns cortes de estilhaços que voaram em mim. Chamavam pelo meu nome e a força aumentava gradativamente. Eu precisava de uma solução. Ao meu redor, procurava desesperadamente por um método rápido que justificasse o fato de eu ignorar aos chamados. Continuavam a bater. Vasculhava gavetas, revirava armários, e só encontrava panos. Um enforcamento seria complicado de arranjar àquela altura do campeonato. Continuavam a bater, eu suava e já nem sentia os cacos sob meus pés perfurando-me intensa e rapidamente. Apenas via minhas pegadas sangrentas sendo deixadas no chão. Esmurravam a porta. No chão, tudo o que restava, além dos pedaços da louça quebrada, era uma faca de carne.

Uma faca.
Foi tudo o que consegui ver. Como se estivéssemos em um filme Hollywoodiano, e eu e a faca tivéssemos nos apaixonado à primeira vista. Todo o resto desapareceu e sorríamos uma para a outra. Andei em direção a ela, gargalhando. A faca também parecia estar satisfeita, por cumpriria sua obrigação. Ainda ouvia pessoas chamando por mim e pareciam realmente preocupadas. Patéticas. Passei a lâmina delicadamente por meu dedo e pude sentir que estava afiada. Olhei o cômodo em que estava e concluí que, ainda depois de tudo, eu era digna de uma morte decente. Fui até minha varanda, que me pareceu limpa, organizada e propícia à ocasião. Suspeitei que estivessem tentando arrombar a porta. Olhei para fora. No prédio em frente, alguns andares abaixo do meu, havia um casal na janela. Ela fumava e ele estava sem blusa. Fiquei olhando para eles por um tempo. A mulher sorriu, eu retribuí. O vento começou a se manifestar e me senti confortável como nunca. Senti-me leve e desisti de colocar em ação meu plano. Virei-me para abrir a porta aos interessados e convidá-los para entrar, afinal, ainda estavam tentando. A faca ainda estava em minha mão. Sorri sozinha quando percebi o desapontamento dela. Eu estava bem. Estava mesmo. Mas a sala não deixava dúvidas. Vivia naquela casa uma pessoa frustrada, abandonada que de nada serviu e de nada serviria. O porta-retrato quebrado ainda estava no chão. O sangue ainda estava espalhado. A foto ainda estava rasgada. A lembrança ainda estava viva.

Uma lembrança.
Era tudo o que eu tinha. Era tudo o que eu continuaria tendo se não fizesse o necessário. Até porque, só teria aquela lembrança. Não poderia vê-la, apenas percebê-la. Não poderia segurá-la, apenas senti-la. Não poderia desistir. Apenas continuar. Retornei para a varanda e soltei um berro. Como aquele primeiro. Mas não um berro desesperado. Este era decidido e se despedia. A faca, que a essa altura já havia entendido o que aconteceria, estava animada. Pude senti-la cortando meu tecido eptelial. Ouvi o grito de horror do casal da janela e os infelizes do lado de fora continuavam esmurrando a porta. Não esperando que eu a abrisse; tentavam arrombá-la. Senti cheiro de sangue e queria mais. Rasguei-me e berrei novamente, satisfeita. Meus sentidos se misturavam e já não conseguia distinguir o branco do preto. O torpor me dominava e eu não tinha mais controle sobre meus movimentos. Tudo o que via era sangue. Sangue vermelho escarlate, espalhando-se ao meu lado. Não enxergava bem, mas pude perceber que a porta havia sido aberta. Muitos entraram, mas eu só senti a presença de uma pessoa.

Uma pessoa.
Era tudo o que percebia, além de chamas incessantes por dentro. Alguns gritavam, mas só ouvia seu choro e sua voz. Você dizendo pra eu lhe responder. Eu queria, juro que eu queria. O problema é que não cabia mais a mim essa atitude. Você segurou minha mão e um choque percorreu meu corpo. Ouvi seu sussurro "Eu te amo...". Agora. Só agora. Depois de meses esperando por isso, só agora eu ouvi. Agora. Quando eu já não podia mais voltar atrás. Quando a decisão havia sido definitiva. Quando eu não podia lhe responder que o sentimento era recíproco. Não há nada mais triste do que isso: um sonho espatifado no chão, dividido em pedaços que, separados, são incoerentes. O sonho, as medidas para que ele se realize, as dificuldades encontradas, os caminhos desviados, e, ao final, a realização de um sonho. Tudo isso ao meu lado, traduzido em um sangue vermelho escarlate, que me negava a realização.

Uma poça d'água...
Um porta-retrato...
Um grito...
Uma faca...
Uma lembrança...
Uma pessoa...

O fim de um sonho.
O fim de uma vida.

Insatisfação

Não gosto de mudanças.
Detesto a inércia.

Não gosto do amor.
Detesto o ódio.

Não gosto de animais.
Detesto seres humanos.

Não gosto de som.
Detesto o silêncio.

Não gosto de doce.
Detesto salgado.

Será que alguma coisa nesse mundo é boa o suficiente para me satisfazer?

Inspirada em conhecidos(as).

Ter ou não ter? Eis a questão.

Não tenho nada,
e tenho medo de perder
tudo.

Não tenho nada,
e tenho ideias para
quando tiver alguma coisa.

Não tenho nada,
e tenho pensamentos
que vão e vêm com o ar.

Não tenho nada,
e tenho a vida,
dela eu faço o que quero.

Não tenho nada,
e tenho medo
e tenho ideias
e tenho pensamentos
e tenho a vida.

Tenho. Tenho muita coisa.

Passa, passa, assa, passa...

Passatempo
que passa
o tempo.

Passatempo
com ou sem
recheio.

Assatempo
que o faz
cozido
ou frito.

Passatempo
que não passa,
nem amarrota.

Tempo que passa
Recheado, ou não
Cozido, frito,
Amarrotado
Ou passado.

No fundo, não importa,
Contanto que passe.

De sonhos à...

Realizações.
As baseadas em sonhos
Frustrações consigo trarão;
Sempre imperfeitas hão de vir.
As baseadas em dificuldades
Fazem luz na escuridão;
Sempre hão de te fazer

Sorrir.
Um ato tão singelo;
Purific'alma
Quando sincero.
Te livra da queda,
Evita o sofrimento
Não há gesto tão

Bonito.
É tudo aquilo
Que aos olhos agrada.
E se aos olhos
Não satisfaz,
De satisfazer o coração
Seria

Capaz?
Sim, você é.
Somos todos.
Passaremos por isso

Juntos.
Todos juntos,
somos forte.
Somos capazes de
fazer o quisermos.
De sonhos à...

Realizações.

In wonderland...

levanto. olho ao meu redor e um sentimento singelo toma conta de mim. ando lentamente pelo caminho de Terra que leva ao pomar. descalça, posso sentir a maciez aveludada do barro sob meus pés. ao andar, vejo uma Família, sentada, protegida pela sombra gentilmente cedida por uma árvore. Pai e Mãe sorriem estarrecidos, admirados com a pureza de seu bebê e surpresos com a novidade que sentem ao olhar para aquela criança tão miúda e, ao mesmo tempo, capaz de lhes causar o sentimento mais forte que já puderam experimentar. sorrio para mim mesma e continuo andando.

visualizo um lago extenso à minha frente. vou andando até que meus pés possam sentir a Água gelada purificadora. respiro fundo, de olhos fechados, e resolvo mergulhar. minha Energia renasce, passo a sentir intensamente cada parte do meu corpo, e todas ela agradecem por estarem em contato com o que há de mais puro. renovada, fico um tempo observando aquela paisagem. o Sol nascente reflete na Água cristalina, seus raios penetram por entre as Nuvens gordas e brancas que me chamam para brincar. num ímpeto, começo a andar pela Areia rente à Água. meu andar calmo e sereno torna-se uma corrida e, sem que eu pense ou decida, pulo com muita vontade de não tocar o solo novamente e começo a seguir em direção às Nuvens.

posso sentir o Vento contra meu rosto e as Nuvens sorriem à medida que me aproximo. sento-me em uma delas, que sustenta todo meu peso. balanço meus pés e, de olhos fechados, aprecio a melodia do Silêncio. lembro-me do pomar, despeço-me das Nuvens e retorno para chão. sinto-me pequena inserida na Imensidão Infinita que me rodeia. andando com a mesma calma habitual, chego aonde queria e saboreio das mais diversas frutas. satisfeita, vejo o Gramado, que a essa hora já reflete a luz do Sol em seu verde agradável, me convidar para um descanso merecido. uma Música celestial começa a tocar, sem que eu localize sua origem. fios dourados entrelaçam-se em minha mente e percorrem, na velocidade da Luz, o caminho para a Eternidade. percebo, então, que tudo isso, por mais simples que seja, me completa. neste lugar, neste momento, sinto-me inteira, completa e Viva.

SEM TÍTULO

Nomenclaturas e títulos
Trazem consigo códigos de barra
Que definem e, consequentemente, limitam
Proibindo, assim, as coisas de serem o que querem.

As diferenças não existem,
muito menos as semelhanças.
Como fazer disso coerente?
Sendo.

Quais as diferenças
Entre uma rosa e uma margarida?
Diversas.
Quais as diferenças
Entre uma rosa e outra rosa?
Muitas.
E, apesar das diferenças,
São chamadas do mesmo modo.

Não há nada igual,
tudo é diferente.