Você me pediu para guardar as poesias que fiz para você. Todas elas. E eu peguei uma por uma e coloquei dentro de uma caixa na gaveta. Li atenciosamente cada palavra e quase me perdi na imensidão em que estava inserida, me senti fora de mim mesma. Fechei a caixa com muito cuidado mas ainda conseguia ouvir todas as letras e sílabas gritando, esperneando. As vozes eram a minha e a sua, tinha também a de alguém que sabe sobre nós aquilo que nós também sabemos mas fingimos não saber. E olha que nosso fingimento não é de propósito. Aos poucos, entendi o método para fazê-las se calarem e hoje em dia não escuto vozes. Não essas.
Você me pediu para guardar os beijos que queria te dar. Todos eles. E eu me contive; segurei cada beijo dentro da minha boca, senti meus lábios secarem, senti minha gengiva quase sangrar e praticamente morri asfixiada por causa da quantidade enorme de beijos tampando minha glote. Os eufóricos com a sua presença, os saudosos com a tua ausência, os tristes com as minhas lembranças e os felizes com as nossas . Todos esses beijos ficaram guardados em minhas papilas gustativas e, aos poucos, aprendi - por necessidade - a engoli-los. Meu organismo aprendeu a absorvê-los e, de vez em quando, sinto uns choques em minhas veias sanguíneas.
Você me pediu para guardar os abraços que queria te dar. Todos eles. Eu me congelei; mantive dentro de mim a energia e busquei fechar meus olhos para não te passar minha sensações que seriam transmitidas pelos abraços. Percebi que você se assustaria com elas. Achava que meus braços tremiam, mas quem realmente tremia era minha alma. Ela estava começando a congelar também, da mesma forma que eu fiz com meu corpo, mas era pela falta do seu calor. Todos os abraços realizaram trabalho gerando energia e depois outro trabalho transformando-a. Eu precisei aprender a me contentar com o abraço de outras pessoas. Mas são só outras pessoas...
Você me pediu para guardar minhas palavras. TODAS elas. Te confesso que não guardei todas; isso seria impossível. Mas as mais relevantes eu retive. Não sei bem onde... acho que as engoli junto com os beijos. Mas, ao invés do estômago ou qualquer outra etapa do meu processo digestivo, elas iam para a cabeça. Ficavam ecoando, circulando de corredor em corredor como se minha mente fosse um labirinto. Algumas voltavam tão convictas de si mesmas que eu até me perguntava se as tinha dito ou não. Tive que aprender a internalizar o silêncio que eu pronunciava. Pena que você não conseguiu ouvi-lo direito...
Você me pediu para guardar minhas lágrimas.
Nunca mais me peça isso.
Você me pediu para guardar minhas lágrimas.
Um comentário:
Incrível, Vivi! Como você escreve bem!
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